Como lidar com a finitude?
Estamos acostumados a pensar que a morte é algo longe e distante, e que provavelmente nunca chegará até nós. Bem, essa reflexão pode lhe mostrar que a morte não está tão longe assim e ela pode ter um tom mais profundo, se você já passou dos 50 anos ou enfrenta uma doença que pode ameaçar sua vida.
Falar sobre a morte em nossa cultura é visto como “trazer má sorte” ou “vira essa boca pra lá”. Estamos cercados pelo Ceifador, porém continuamos vivendo como se ele não estivesse a nossa espera. Vivemos relações com pessoas sempre na prerrogativa de que elas serão eternas e sempre estarão presentes. Mesmo que lá no fundo sabemos que isso não é verdade.
Por isso, gostaria de dialogar com você sobre a finitude humana e alguns questões que podem lhe trazer pensamentos novos. Tenha você 80, 50 ou 20 anos. Esteja você doente ou aparentemente saudável.
Por que a morte nos assusta?
Está ai uma pergunta que dificilmente conseguimos responder. Não sabemos ao certo o por quê da morte nos assustar, mas temos medo dela. Ou melhor, teríamos medo do processo da morte?
Na filosofia do yoga o desejo de sobrevivência ou medo da morte é chamado de Abhiniveśā. Esse é um tipo de sofrimento que até mesmo os mais sábios estão sujeitos. É um desejo intrínseco a todo ser vivo. Nós desejamos até o último suspiro sobreviver. Claro, questões de suicídio fogem completamente dessa regra. Entretanto, por hoje não lidaremos com a questão, não hoje.
Você já se perguntou honestamente quais são seus maiores medos da morte?
- Você teme a dor do processo de morrer?
- Você se entristece por deixar pessoas amadas para trás?
- Você tem medo do que vai encontrar após a morte, dependendo da sua religião, terá um paraíso ou o inferno?
- Você tem medo de fechar os olhos e nunca mais abri-los?
- Você se lamentará por todas as experiências de vida que você ainda não conseguiu realizar?
- Você faria tudo por mais uma chance de estar vivo?
- Você teme que após sua morte, você será completamente esquecido?
- Você já pensou que sua morte pode ser lenta e dolorosa e não há nada que você poderá fazer?
- Você teme por perder a autonomia de si mesmo e acabar em uma cama de hospital de forma indigna?
- O quão você amou e foi amado enquanto estava vivo?
E agora talvez a pergunta mais importante de todas:
Você viveu uma vida plena?
Gosto de pensar que uma vida plena é aquela recheada de sorrisos, choros, alegrias, tristezas, sonhos, desilusões, esperanças, dor, gentileza, gozo, surpresas, realizações, decepções e todas as emoções que o corpo humano é capaz de conceber.
A morte na visão de um epicurista
Antes de continuarmos sobre as reflexões, eu preciso lhe contar sobre os epicuristas. Uma escola de filosofia grega que tinha como meta principal a busca pela felicidade. Seja essa felicidade, uma meta alcançável ou não, talvez nunca saberemos, mas podemos trazer aqui um pensamento interessante epicurista sobre a morte.
Para um epicurista, nós não devemos temer a morte, pois quando a morte estiver presente “nós não estaremos mais lá”. Em outras palavras, nós não devemos ter medo da morte, pois com ela, nossas sensações do corpo são encerradas e por isso nós não sentiremos absolutamente nada.
Sinceramente não sei o quão acalentador isso realmente é, mas pensei ser interessante compartilhar com você. Eu particularmente, acho uma resposta simplicista demais para tentar trazer algum conforto sobre a morte. Talvez o que mais tememos na morte seja as pessoas que deixaremos para trás, e essas pessoas, com toda certeza, estarão com os sentidos completamente intactos e sentirão cada segundo da nossa ausência.
O caderno de visitas no leito de morte
Alguns podem me chamar de trágico ou até de mórbido. Recentemente em uma conversa com alguém muito querido, eu expressei o desejo de que se um ia eu estivesse inconsciente em uma cama de hospital, eu gostaria de deixar um caderninho de visitas ao lado da minha cama. Assim todos que viessem me visitar enquanto eu não estivesse presente, poderiam deixar seus nomes e mensagens pra mim. Então, quando eu retornasse, ahhh e eu espero que realmente eu retorne, eu gostaria de ler o que todos gostariam de ter me dito enquanto eu estava bem e não me falaram.
Como você deve imaginar, essa conversa não foi muito bem recebida. Entre as inúmeras objeções houve um momento até de riso e de incredibilidade ao que eu falava. E eu falava realmente sério! Eu adoraria ter um caderno de presença das visitas, e mais, eu ainda acrescentei que eu esperaria ter pelo menos 30 visitas no hospital.
Mais uma vez, como você deve imaginar, minha afirmação foi recebida com total surpresa. Como assim eu desejo que pelo menos 30 pessoas venham me visitar se um dia eu estiver em uma cama de hospital? Que exigência maluca é essa? Quem sou eu para achar que tenho o direito de exigir alguma coisa dos meus amigos?
Pois é, eu pensei sobre isso. Será que eu teria direito de esperar que pelo menos 30 pessoas me visitassem no hospital? E a resposta foi, sim!
Penso que se eu não tenho confiança de que pelo menos 30 pessoas iriam me visitar no hospital, eu preciso seriamente questionar sobre a qualidade das relações que eu tenho hoje. Será realmente que as pessoas com quem eu amo passar um tempo juntos é suficiente para elas apenas me visitarem no hospital? Lembro que eu não faço exigência de ninguém ficar comigo 24hrs, me dar banho, caso seja necessário, ou me ajudar financeiramente. A única coisa que espero é que pelo menos 30 pessoas do meu círculo de amigos, possam achar um tempinho na sua agenda mui ocupada para me fazerem uma singela visita no hospital. Só isso.
Eu trago essa reflexão também para você. Quantas pessoas você acha que lhe visitariam no hospital? E se a resposta é nenhuma ou um número muito baixo, talvez você deveria repensar sobre a qualidade das relações que você tem hoje. Você está tem relações plenas ou somente passatempo?
O remorso de quem fica
Penso que a morte é um processo doloroso pra quem vai mas igualmente penoso para quem fica. Fico me perguntando quantas vezes deixamos de falar para pessoas que os amamos, deixamos de dar um abraço gostoso em pessoas queridas e deixá-las cientes do quão importantes elas são para nós.
Qual foi a última vez que você olhou para uma pessoa querida do seu ciclo de amigos e disse exatamente o que sente por ela? E eu não falo isso em se tratando de assuntos amorosos, não, Deus me livre! Eu falo em relacionamentos de todos os tipos, entre irmãos, amigos, vizinhos, alunos, pais, colegas de trabalho, entre outros.
Talvez parte da quantidade de lágrimas que derramamos com a partida de alguém querido tenha uma parte do lamento por não ter feito a pessoa feliz, por ter sido tão mesquinho com a pessoa ou ainda por simplesmente não ter estado presente. É por isso que eu digo que devemos valorizar cada segundo que passamos ao lado de pessoas amadas. Pois você nunca sabe quando serão os últimos.
Recentemente eu perdi um amigo, acho até que ele não me considerava tão próximo assim. Porém quis ir no hospital visitá-lo. Mesmo não sendo o melhor amigo, pude ver a cara de felicidade com que ele fez ao me ver enquanto no quarto de hospital. Pra mim, isso foi 30 minutos do meu dia, porém para ele, eu imagino que deva ter sido muito especial.
Demos risadas e falamos que assim que ele ficasse bem, iriamos tomar um café e fazer caminhada. Coisa que eu poderia ter muito bem feito antes, mas não o fiz. Enfim, agora eu lamento por não.
Com o passar do tempo ele foi ficando debilitado e os planos de tomar café e fazer caminhada foram se transformando em desejos de “se cure” e em alguns dias para “tomara que sobreviva”. Em todas essas mudanças de desejos e pensamentos eu me perguntava constantemente: o que eu tenho feito da minha vida?
Me lembro de uma das visitas, durante a saída do quarto, ter colocado a mão na maçaneta da porta para ir embora e ter pensado
Eu tenho a capacidade de andar, colocar a mão na maçaneta, abrir a porta, atravessá-la, fechar a porta e caminhar livre pelos corredores e em 1 minutos estarei na rua caminhando.
Esse pensamento devastou minha alma, pois meu amigo não tinha condições sequer de sair da cama. Essa opção de abrir a porta e ir embora estava disponível apenas pra mim, infelizmente.
Existe vida após a morte?
Eu poderia escrever páginas e mais páginas de teorias e crenças sobre a vida após a morte. Teorias complicadas de como nossa consciência poderia de alguma forma sobreviver ao efeito esmagador da entropia que nos assola a todo momento. Mas eu não o farei.
A grande verdade é que não temos a menor certeza se sobrevivemos ou não após a morte.
Eu adoraria falar teorias grandiosas que pudesse lhe fazer sentir bem, que de alguma forma lhe desse esperança de que essa vida terrena aqui fosse temporária e fugaz, mas ao mesmo tempo eu estaria afirmando que essa vida aqui, essa mesma vida aqui que você e eu estamos, não é demasiadamente importante ou valorosa.
Não, eu não poderia fazer isso com você lhe dando esperanças ou teorias açucaradas de algo que ninguém tem certeza. A única certeza que temos, além a morte, é que essa nossa vida é real e vale a pena viver.
Essa nossa vida pode ser cheia de dores, sofrimentos e tédio, como diria nosso querido Schopenhauer, mas ela também é fonte das experiências mais grandiosas que nossa pequena alma humana pode ter.
Por isso que eu gosto de valorizar esses momentos que tenho aqui na Terra, pois estes sim, eu sei que são reais e está ao meu alcance.
10 passos para se ter uma vida mais plena
Como você já deve saber, eu não gosto muito disso de “10 passos para o sucesso”, “10 receitas infalíveis para perder peso” ou “10 segredos para a felicidade”. Este tipo de “10 passos” sempre dá a impressão de que a resolução de problemas são fáceis, entretanto, eu gostaria de dar uma breve lista de 10 coisas que eu julgo interessantes para se ter uma vida mais plena. Esses passos não são os únicos passos, provavelmente tem dezenas deles, você pode inclusive adicionar alguns nos comentários, fique a vontade.
Vamos lá, de acordo com o Rudra Das, 10 passos para você ter uma vida mais plena
- Cuide da sua saúde, nada vale a pena se ela estiver forte.
- Retire este frase da sua via “ah tá, vamos marcar um cafezinho qualquer dia desses”. Se você deseja encontrar alguém, encontre.
- Leia o maior número de livros possível. Isto servirá como escudo de resiliência para momentos difíceis.
- Não desperdice essa vida na promessa de uma vida futura melhor em uma outra dimensão.
- O mundo não é justo, não espere reconhecimento, justiça ou elogios. Faça o que tem de fazer porque você o deseja e não porque você espera algo o mundo.
- Aprecie profundamente membros próximos da sua família, em especial pais, irmãos e avós. Você só saberá o real valor deles quando eles se forem.
- Sempre visite amigos e colegas no hospital. Você pode ser um ponto de luz para alguém que vive um momento muito difícil.
- Visite um médico com frequência e encare sua saúde como algo preventivo e não reparador.
- Aprenda yoga e meditação.
- Não tenha medo de arriscar algo novo somente por achar que não tem idade para isso ou que já está velho demais pra isso.
É isso, a morte é algo que se deva ser discutido enquanto ela não está presente, pois quando a Senhora está na sala, a dor faz com que tudo fique difícil e nosso coração fica pesado demais para sequer pensarmos em alternativas para encarar esse momento todo delicado, que mais cedo ou mais tarde chegará para todos nós, e que mesmo assim, parece que é a última coisa do mundo do qual nos preparamos.